"A continuidade do crescimento demoeconômico e da pegada antrópica, no contexto do metabolismo entrópico, pode levar ao colapso da economia moderna", alerta José Eustáquio Diniz Alves, doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População, Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE, em artigo publicado por EcoDebate, 05-04-2017.
Eis o Artigo
“A terra não nos pertence, nós pertencemos a Terra”
Chefe Seattle
“Somos a primeira espécie capaz de auto-aniquilação”
Elon Musk
Um vídeo do Museu de História Natural norte-americano mostra a evolução da população humana, desde o surgimento do Homo Sapiens – há cerca de 200 mil anos – até os dias atuais, contando a expansão da presença humana e as migrações em apenas 5 minutos.
Como descrevi no artigo, “Somos todos afrodescendentes” (21/09/2016), o Homo Sapiens surgiu na África e iniciou seu processo de migração para fora do continente por volta de 90 mil anos atrás. O número total de indivíduos da espécie permaneceu baixo (menos de um milhão de pessoas) até o início da revolução agrícola que ocorreu aproximadamente 10 mil anos atrás.
Mas com o crescimento da produção agrícola e o avanço das cidades, a população mundial, aproveitando a ampla disponibilidade de recursos naturais, chegou a 5 milhões de habitantes por volta do ano 8 mil anos atrás. No ano de nascimento de Cristo, ano 1 da era cristã, a população mundial era de 170 milhões. No ano 1000 a população mundial alcançou a cifra de 330 milhões. Por volta de 1350 a população chegou a 370 milhões e pela primeira vez teve uma queda devido à peste bubônica.
Na época das grandes navegações e do descobrimento do Brasil, a população mundial estava por volta de 450 milhões de pessoas, gastando cerca de 1500 anos para dobrar de tamanho. Por volta de 1800, com o início da Revolução Industrial e Energética, a população mundial chegou a 1 bilhão de habitantes. Ou seja, demorou 200 mil anos para a humanidade atingir o volume de mil milhões de pessoas.
A marca de 2 bilhões de habitantes foi atingida em 1927. Os 3 bilhões foi em 1960, 4 bilhões em 1974, 5 bilhões em 1987, 6 bilhões em 1999 e 7 bilhões em 2011. Assim, a humanidade tem adicionado 1 bilhão de habitantes a cada 12 ou 13 anos. A marca de 8 bilhões deve ser atingida em 2023 ou 2024.
O gráfico abaixo, com base nas projeções da Divisão de População da ONU, mostra que a população mundial em 2100 pode variar entre, aproximadamente, 7 bilhões e 17 bilhões de habitantes. Com estimativa média de 11 bilhões. Tudo depende, fundamentalmente, da taxa de fecundidade.
colocar aqui a legenda (Foto: nome do fotógrafo)
A taxa de fecundidade total (TFT), no mundo, começou a cair a partir de 1960, passando de 5,02 filhos por mulher em 1960-65, para 2,53 filhos no quinquênio 2005-10. Ou seja, em 50 anos a TFT caiu pela metade. A queda média neste período foi de meio (1/2) filho por década. O destaque foram as décadas de 1960, 1970 e 1980 com uma queda conjunta de 2 filhos por mulher, pois a TFT mundial estava em 5,02 filhos no quinquênio 1960-65 e caiu para 3,04 filhos no quinquênio 1990-95. A maior redução aconteceu na década de 1970, com uma queda de 0,84 filhos, sendo que países como a China e o Brasil tiveram reduções expressivas.
Na década de 1990 a taxa de fecundidade continuou caindo, mas já apresentou uma desaceleração, pois a redução foi de 0,45 filho por mulher. Mas a quase estagnação aconteceu na primeira década do século XXI, com uma queda de somente 0,09 filho, pois a TFT estava em 2,59 filhos por mulher no quinquênio 2000-05 e caiu para 2,5 filhos por mulher no quinquênio 2010-15.
A projeção média da Divisão de População da ONU indica que a redução na fecundidade média da população mundial vai continuar desacelerando ao longo do século XXI. Ou seja, em 50 anos a TFT caiu 2,5 filhos por mulher, mas as projeções indicam que deve cair apenas meio (0,5) filho por mulher nos próximos 90 anos. No caso da hipótese média da ONU, que pressupõe a estabilização da TFT ao nível de reposição, o volume total de população mundial ficaria ao redor de 11 bilhões de habitantes em 2100. Se a TFT ficar meio (0,5) filho acima do nível de reposição a população mundial chegaria a quase 17 bilhões de habitantes em 2100. Mas se a TFT ficar meio (0,5) filho abaixo do nível de reposição a população mundial ficaria abaixo de 7 bilhões de habitantes em 2100.
(Fonte: EcoDebate)
Portanto, uma variação de apenas meio (0,5) filho por mulher pode fazer a população mundial variar em torno de 10 bilhões de habitantes nos próximos 90 anos, ou seja, entre 7 e 17 bilhões de indivíduos da raça humana, em 2100. O futuro está aberto.
A questão é que o mundo, em 2017, já conta com 7,5 bilhões de habitantes e já tem uma Pegada Ecológica 64% maior do que a biocapacidade da Terra. Além disto já ultrapassou 4 das 9 fronteiras planetárias, segundo metodologia do Stockholm Resilience Centre. A concentração de CO2 na atmosfera se aproxima de 410 partes por milhão (ppm), quando o nível minimamente seguro é 350 ppm. O aquecimento global e a subida do nível dos oceanos ameaça diretamente 2 bilhões de pessoas que vivem a menos de 2 metros do nível do mar. A degradação dos ecossistemas agrava as perspectivas ambientais para as próximas décadas. O Antropoceno está provocando a 6ª extinção em massa das espécies da Terra. Um acréscimo de quase 4 bilhões de habitantes nos próximos 85 anos vai colocar um grande desafio para a humanidade, pois a destruição da comunidade biótica pode inviabilizar a continuidade do progresso humano, sendo que o ecocídio é também um suicídio.
Em entrevista ao site IHU (25/03/2017), o sociólogo Giuseppe Fumarco mostra que mesmo pessoas preocupadas com a ecologia e com a possibilidade de uma catástrofe ambiental (como o Papa na encíclica Laudato si’) não abordam de maneira adequada a questão demográfica. Ele reafirma: “Partimos de uma primeira constatação banal: os 7 bilhões de indivíduos que povoam o planeta (entre os 8 e os 9 bilhões previstos para 2050) há muito tempo já superaram a capacidade do ecossistema que os sustenta. Cada alerta neste campo já é irremediavelmente tardio. A humanidade – em particular desde a Revolução Industrial – prosseguiu antropizando selvagem e destrutivamente a biocenose e o biótopo em que habitava e, assim, se metamorfoseou […]. Poderá (talvez) sobreviver, mas em condições psiquicamente alienadas. Para rastrear uma relação mais equilibrada com a natureza, devemos remontar para bem antes da Revolução Industrial”.
De forma semelhante, Charles St. Pierre (16/11/2016), tratando da armadilha do crescimento, mostra que todo sistema econômico e todo sistema auto-organizado que não se autolimita dentro das fronteiras estabelecidas pelo seu meio ambiente, cresce até exceder a capacidade do ecossistema para apoiá-lo e sustentá-lo. Em seguida, ele colapsa.
Mas em vez de se auto limitar diversos governos estão restringindo o acesso aos meios de regulação da fecundidade. Os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) colocaram como objetivo a “universalização dos serviços de saúde reprodutiva” até 2015. Evidentemente, este objetivo não foi alcançado. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS) existem cerca de 225 milhões de mulheres, em período reprodutivo, sem acesso aos métodos contraceptivos. O governo Donald Trump está atacando os direitos reprodutivos e restringindo a atuação da Planned Parenthood Federation e cortando verbas para o apoio que a ONU fornece aos países menos desenvolvidos para melhorar a saúde sexual e reprodutiva.
A crise já bate à porta. O secretário-geral-adjunto para Assuntos Humanitários e Emergências da ONU, Stephen O’Brien, alertou, em março de 2017, que o mundo está sofrendo a maior crise humanitária nos mais de 70 anos de história da instituição. Ele pede recursos urgentes para Iêmen, Sudão do Sul, Nigéria e Somália, para evitar que um desastre como o da Segunda Guerra Mundial não voltasse a ocorrer, pois o que se vê atualmente é uma série de conflitos envenenados, em diversos lugares, que traça um balanço sinistro. O secretário-geral Antonio Guterres fez uma visita de emergência à Somália, afetada por uma grave seca que deixou ao país no limiar de uma epidemia de fome.
A população humana gastou 1500 anos para dobrar de tamanho e deve gastar menos de 100 anos para quadruplicar de 2 bilhões em 1927 para 8 bilhões em 2025. Mesmo já ultrapassando a capacidade de carga do Planeta e já tendo dificuldades para garantir a segurança alimentar e a manutenção da biodiversidade, as projeções indicam que a população mundial pode chegar a mais de 11 bilhões de habitantes em 2100.
A continuidade do crescimento demoeconômico e da pegada antrópica, no contexto do metabolismo entrópico, pode levar ao colapso da economia moderna. Os custos sociais e ambientais podem ser catastróficos se a queda da fecundidade não se acelerar e se não houver um decrescimento da produção e do consumo da população mundial.
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